Santos quer um estilo de jogo que Jair Ventura ainda não pode entregar
A ideia de resgate do DNA ofensivo santista como previa o presidente José Carlos Peres na apresentação de Jair Ventura lá no mês de janeiro, simplesmente não pode ser alcançada com o comandante ex-Botafogo. Isso porque falta ao Peixe peças adequadas para organizar um jogo que pense primeiro no ataque do que proteger a própria meta.
Na rodada passada da Libertadores, na suada vitória sobre o Estudiantes por 1 a 0, mais uma vez o Santos jogou fechadinho, procurando os contra-ataques e sofrendo com as bolas aéreas dos argentinos. Ainda por cima, contou com a fase ‘’milagreira’’ do goleiro Vanderlei, o melhor jogador da partida.
O time da Vila Belmiro fez um bom papel no Campeonato Paulista, é verdade, mas sofre para encaixar boas atuações na principal competição das Américas nesta temporada. Embora ocupe a liderança de sua chave, as duas vitórias vieram com mais disposição e entrega do que controle sobre o adversário. A derrota na altitude para o frágil Real Garcilaso logo na estreia também não deixou boa impressão para comissão técnica e jogadores.
Em dificuldades financeiras, o Peixe viu as principais peças criativas irem embora ao final da temporada passada e poucas reposições à altura. Se por um lado, as chegadas de Gabigol e Eduardo Sasha supriram a lacuna deixada por Ricardo Oliveira, o mesmo não pode ser dito desde a saída de Lucas Lima, que não possui um substituto do mesmo nível no elenco. Sem um meia organizador definido, Jair tem dificuldades em colocar em prática um futebol com trocas de passes e movimentação. O treinador até arriscou nomes como Vecchio, Vitor Bueno e Diogo Vitor na criação, mas sem muito sucesso. Pra piorar o cenário de carência ofensiva, a referência técnica do time em 2017, o atacante Bruno Henrique, sofreu uma lesão rara no olho direito, ainda nos primeiros minutos da estreia do Santos no Paulistão. O camisa 27 está fora de combate desde então e faz muita falta.
A solução encontrada por Ventura nos jogos mais importantes do ano tem sido o velho jogo reativo dos antecessores Levir Culpi e Elano, organizando o terreno defensivo com ocupação de espaços e transição rápida usando os homens de velocidade pelos lados do campo. Ou seja, mais do mesmo. Quando fica mais tempo com a bola, a maneira de chegar à área passa a ser os cruzamentos da intermediária e os lançamentos longos, quase sempre encontrando a defesa adversária bem postada.
Cobrado para utilizar com frequência os meninos da base (mais uma marca do DNA santista de fazer futebol) Jair se viu obrigado a queimar as etapas de formação de alguns jovens. Atletas ainda com idade de juniores como Victor Yan, Yuri Alberto e Rodrygo Góes foram precocemente alçados ao elenco principal e deixaram inclusive de disputar a Copa São Paulo, que poderia dar uma cancha aos garotos.
Com vários jogos grandes pelo caminho, tanto no Paulistão, quanto na Libertadores, apenas Rodrygo, de 17 anos, se firmou no time principal. O garoto foi eleito a revelação do Estadual e teve boa participação até agora no torneio continental, correspondendo com gols importantes. Ainda assim, é visível o receio do comandante em queimar as promessas do clube e desperdiçar precocemente talentos que podem ser úteis mais para a frente.
Com uma carreira curta, de menos dois anos e meio como técnico profissional, Jair Ventura vai precisar mostrar uma nova faceta em sua filosofia de jogo. Liderando o Botafogo, a marca do comandante foi justamente a organização defensiva e e a forte saída em velocidade para o ataque. Quando encontrava defesas mais fechadas, o treinador tinha muita dificuldade em dar ao alvinegro uma alternativa para furar os bloqueios rivais. É preciso ressaltar também as semelhanças de cenário financeiro e de elencos entre os dois trabalhos.
O fato é que a diretoria santista apostou em alguém que ainda possui uma maneira de pensar futebol que se opõe ao pensado pela diretoria na virada do ano. O denominador comum entre as duas partes ainda vai demorar a chegar. Será preciso paciência e procura incessante pela melhoria no desempenho, coisa rara nos ‘’planejamentos’’ dos clubes brasileiros, que visam sempre o resultado em primeiro lugar e as demissões como solução.
Já para Jair, será preciso mudanças de conceito, métodos de treinamento e tempo. A parada para a Copa do Mundo pode ser importante neste contexto, mas a exigência por resultados nas grandes competições durante a temporada pode atrapalhar.